ORTODONTIA CONTEMPORÂNEA: Abordagem ortodôntica frente ao paciente periodontal adulto

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Abordagem ortodôntica frente ao paciente periodontal adulto



Neste artigo publicado em 2003, pela Revista Stomatos, pelos autores Mauro Cordeiro D’Ornellas, Luciane Hahn, Ernani Menezes Marchioro; da disciplina e especialização em Ortodontia do Curso de Odontologia da ULBRA - Canoas - Rio Grande do Sul. Discorre sobre a conduta ortodôntica perante o paciente adulto acometido de doença periodontal, com as considerações biomecânicas, indicações, contra-indicações, vantagens, desvantagens e limitações, não deixando de expor também as expectativas do mesmo.

Atualmente observa-se uma grande e crescente procura pelo tratamento ortodôntico por parte dos adultos. Estes pacientes, algumas vezes, estão acometidos de doença periodontal que apresenta uma série de conseqüências desagradáveis. Sendo assim, ao optar-se por um tratamento ortodôntico em circunstância tão adversa, o cirurgião-dentista deve-se estar ciente de como proceder para o sucesso da terapia ortodôntica que há de ser aplicada.

Segundo a literatura (Taichman, Lindhe, 1992; Lascala, Moussalli, 1993; Sanders, 1999; Johal, Ide, 1999; Janson, Janson, Ferreira, 2001), a doença periodontal é definida como uma reação inflamatória à presença da placa bacteriana.

Para Rabie, Deng, Jin (1998) e Sanders (1999), a retenção de placa bacteriana compreende o principal fator etiológico da doença periodontal. Entre outros fatores, o mal posicionamento dentário tem sido considerado um importante fator etiológico predisponente à doença periodontal (Diedrich, 1996; Rabie, Deng, Jin, 1998). Lascala, Moussalli (1993), Harfin 1999) e Tamburus, Teixeira, Garbin (2002), afirmaram que este constituía um fator de manutenção ou um agravante em relação à enfermidade periodontal, na medida em que dificultaria o controle da placa bacteriana pelo paciente, levando a uma má ou pobre higiene dentária.

A doença periodontal caracteriza-se primeiramente por alterações de cor e textura gengivais (Nyman, Lindhe, 1992). Quanto à alteração de cor, a gengiva torna-se vermelha a partir das papilas e a tumefação também pode se fazer presente (Lascala, Moussalli, 1993). A mesma, segundo Lascala, Moussalli (1993) compromete o contorno e a forma gengival. Há, por fim, a ocorrência de sangramento, provocado à sondagem na área do sulco ou bolsa periodontal (Nyman, Lindhe, 1992). De acordo com Wennström et al. (1993), o desenvolvimento da doença periodontal pode resultar na formação de crateras ósseas, defeitos ósseos angulares com tecido conjuntivo inflamado e num epitélio dentogengival localizado apicalmente à crista do osso alveolar.

Radiograficamente, a doença pode ser reconhecida pela redução da altura do osso alveolar de suporte. Se a perda óssea progrediu em ritmo semelhante em uma certa parte da dentição, o contorno da crista do osso remanescente é igual nas radiografias: perda óssea horizontal. Defeitos ósseos angulares representam a conseqüência de perda óssea que ocorreu em ritmos diferentes ao redor de dentes e/ou superfícies diferentes: perda óssea vertical (Nyman, Lindhe, 1992).

Uma das conseqüências mais comuns da doença periodontal no paciente adulto é a mudança de posição e de inclinação de um ou mais dentes (Ong, Wang, Smith, 1998; Harfin, 1999). Classicamente, o paciente apresenta o segmento labial superior acometido de rotações, extrusões, formação de espaços irregulares (Brunsvold, Zammit, Dongari, 1997; Johal, Ide, 1999), projeções para a região anterior (Johal, Ide, 1999), geralmente em forma de leque (Brunsvold, Zammit, Dongari, 1997; Melsen, Kalia, 2001) e inclinações para espaços edêntulos (Brunsvold, Zammit, Dongari, 1997).

É importante salientar que o tratamento ortodôntico não pode ser iniciado antes de uma terapia periodontal apropriada, visando o controle da inflamação (Capelozza et al., 2001; Janson, Janson, Ferreira, 2001; Cardaropoli et al., 2001; Tamburus, Teixeira, Garbin, 2002). Segundo Capelozza et al. (2001); Cardaropoli et al. (2001), a mesma deve ser mantida durante a terapia ortodôntica. Melsen, Kalia (2001); Tamburus, Teixeira, Garbin(2002) afirmaram que a inflamação deveria ser controlada não somente antes e durante, como também após a movimentação ortodôntica. Desta forma, Nett, Cirtu(2000) sugeriram um programa de manutenção periodontal de três meses, após o tratamento ortodôntico. Já Melsen, Kalia (2001) propuseram que o mesmo fosse mantido de forma permanente. De acordo com Tulloch (1995) e Johal, Lee (1998), o tratamento ortodôntico somente começaria após um período de 6 meses, onde os tecidos periodontais estariam estabilizados e destituídos da inflamação ativa. Para Cardaropoli et al. (2001), 7 a 10 dias após os procedimentos periodontais já seria possível instituir a mecanoterapia ortodôntica.

Segundo a literatura (Rabie, Deng, Jin, 1998; Sanders, 1999; Nett, Cirtu, 2000; Melsen, Kalia, 2001; Cardaropoli et al., 2001), o tratamento dos pacientes envolve uma ação multidisciplinar onde o periodontista, o clínico-geral e o ortodontista buscam o tratamento mais adequado para o paciente adulto.

No tratamento ortodôntico propriamente dito pode-se lançar mão de movimentos intrusivos(Nicolay, Fine, 1999; Aguirre-Zorzano et al., 1999; Cardaropoli et al., 2001; Janson, Janson, Ferreira, 2001), extrusivos (Ong, Wang, Smith, 1998; Sanders, 1999; Janson, Janson, Ferreira, 2001), de corpo (Ong, Wang, Smith, 1998; Sanders, 1999), de verticalização (Melsen, Agerbaek, Markenstam, 1989; Janson, Janson, Ferreira, 2001) e de inclinação (Duncan, 1997b; Ong, Wang, Smith, 1998). Por outro lado, alguns autores contra-indicam determinados movimentos tais como o de intrusão (Tulloch, 1995), o de inclinação e o extrusivo, quando agravante da situação periodontal (Proffit, 1995; Sanders, 1999).

Segundo Thilander (1992) e Ong, Wang, Smith (1998), de uma maneira geral, a força aplicada inicia num grau leve, em torno de 20 a 30g por dente, aumentando para 30 a 50g nos movimentos de inclinação e 50 a 80g nos movimentos de corpo, dependendo do grau de perda óssea marginal e da quantidade de osso alveolar remanescente. Especificamente, nos movimentos intrusivos, a força pode variar de 5 a 15g por dente (Ong, Wang, Smith, 1998; Johal, Ide, 1999) ou, segundo Rabie, Deng, Jin (1988) e Cardaropoli et al. (2001), de 10 a 15g. Já a força extrusiva, segundo Frank, Pearson, Booker (1995), pode manter-se entre 25 e 100g/cm2. Em relação à natureza da força, a mesma deve apresentar-se leve (Johal, IDE, 1999; Capelozza et al., 2001), intermitente (Thilander, 1992; Ong, Wang, Smith, 1998) e individualizada numa relação direta com a quantidade de periodonto de inserção (Tamburus, Teixeira, Garbin, 2002), sendo reativada a cada três ou quatro semanas (Thilander, 1992). Já, Harfin (1999) sugeriu individualizar o período de tempo entre uma ativação e outra.

Segundo Diedrich (1996), há a necessidade de uma abordagem biomecânica diferenciada frente a uma condição de perda de inserção, pois a mesma se traduz com reduzida superfície radicular frente ao osso, migração apical do centro de resistência e qualidade de ancoragem decrescente. Sendo assim, é necessário adaptação na magnitude da força, imprimindo um sistema de forças (força e momento) adequado, visando o tipo de movimento dentário desejado.

A forma de contenção dos dentes após o tratamento apresenta variações, podendo ser temporária, semi-permanente ou permanente (Thilander, 1992). Segundo Aguirre-Zorzano et al. (1999) e Harfin (1999), a contenção apresenta-se de forma permanente com fio ortodôntico trançado, colado na face palatina ou lingual de cada dente que foi movimentado. Já Johal, Lee (1998) e Johal, Ide (1999), sugeriram a colagem e também uma placa de Hawley, como segurança. Proffit (1995) preconizou como contenção, a curto prazo, a moldeira de plástico adaptada a vácuo, o splint oclusal ou a placa wraparound. Melsen, Kalia (2001) propuseram o uso de um splint removível ao dormir. Cardaropoli et al. (2001) indicaram a colagem de um dente ao outro, na região interproximal, com resina composta. De qualquer forma, segundo a literatura, é necessário que a contenção seja fixa e por um longo período, visando a diminuição dos movimentos secundários dos dentes e criando condições favoráveis para recuperação óssea (Tamburus, Teixeira, Garbin, 2002).

Segundo Tulloch (1995), entre as indicações têm-se a facilitação do tratamento restaurador, o melhoramento da saúde periodontal e o estabelecimento de uma proporção coroa-raiz favorável numa orientação vertical, fazendo com que as forças oclusais sejam transmitidas no sentido do longo eixo dos dentes.

De uma forma ampla, segundo a literatura, a estética e a função constituem fatores indicativos plausíveis de tratamento (Lascala, Moussalli, 1993; Feres, 1999). Para Fastlicht (1982) e Tamburus, Teixeira, Garbin (2002), assim como a estética e a função são importantes, o aspecto psicológico do paciente também consta da indicação.

Segundo Aguirre-Zorzano et al. (1999), a simples presença de placa bacteriana contra-indica o tratamento ortodôntico. Para Capelozza et al. (2001) e Janson, Janson, Ferreira (2001), a presença da inflamação é que constitui contraindicação. De acordo com Diedrich (1996), dentes com um prognóstico questionável apresentando perda de inserção acima do terço apical, envolvimento de furca avançado e formas avançadas de periodontite – periodontite de rápida progressão – devem ser tratados ortodonticamente somente em casos excepcionais.

Nicolay, Fine (1999) e Tamburus, Teixeira, Garbin (2002) apresentaram contra-indicações do tratamento ortodôntico as quais incluiam problemas sistêmicos que dificultam o controle do tratamento, falta de cooperação e motivação do paciente, falta de controle do processo inflamatório e infeccioso, inabilidade para conter os dentes nas novas posições obtidas e movimento ortodôntico resultando numa oclusão instável. Tamburus, Teixeira, Garbin (2002) colocaram a perda óssea acentuada ao nível do processo alveolar como importante contra-indicação.

Segundo a literatura, há inúmeras vantagens da realização do tratamento ortodôntico em pacientes com problemas periodontais. Entre elas destaca-se: o melhor acesso para higienização
(Cardaropoli et al., 2001; Capelozza et al., 2001), a redução das cargas não axiais (Duncan, 1997a; Rabie, Deng, Jin, 1998; Janson, Janson, Ferreira, 2001), o ganho de inserção (Janson, Janson, Ferreira, 2001), a redução dos defeitos ósseos (Janson, Janson, Ferreira, 2001), a restituição da oclusão incisal (Cardaropoli et al., 2001; Capelozza et al., 2001) a melhora da anatomia periodontal (Rabie, Deng, Jin, 1998; Cardaropoli et al., 2001; Janson, Janson, Ferreira, 2001), o aumento do selamento labial (Duncan, 1997a), a melhora no comprimento da coroa clínica e dos níveis de margem óssea (Cardaropoli et al., 2001), a estimulação do processo de cicatrização óssea e periodontal e o uso do movimento ortodôntico como subsídio na preparação de futuros sítios para colocação de implantes.

Capelozza et al. (2001) e Janson, Janson, Ferreira (2001), citaram a dificuldade na manutenção da limpeza da aparelhagem quanto a remoção da placa. Isto é comum em virtude do aparelho favorecer a formação e a retenção da mesma (Tamburus, Teixeira, Garbin, 2002). Duncan (1997a) comentou a respeito do aumento da mobilidade dental durante o tratamento. Diedrich (1996) salientou que o tratamento ortodôntico não apresentava garantias quanto à existência de um efeito global profilático, evitando toda e qualquer recorrência de doença periodontal futura.

Ao longo do diagnóstico e planejamento ortodôntico do paciente adulto com problemas periodontais, alguns pontos extremamente importantes devem ser considerados na busca do sucesso da terapêutica ortodôntica.

Primeiramente, deve-se sanar todo e qualquer processo inflamatório pré-existente para realmente iniciar a movimentação ortodôntica. O acompanhamento de um periodontista é essencial, não só antes, como também durante e após o tratamento. A ancoragem deverá ser reforçada e a força aplicada deverá ser leve e intermitente, respeitando a integridade periodontal remanescente.

Os períodos de reativação serão de 3 a 4 semanas, podendo ser aumentados em virtude das particularidades individuais envolvidas. O tratamento ortodôntico aplicado nesta circunstância visa o restabelecimento estético e funcional somente dos dentes migrados, não tendo a pretensão de ser uma terapia ortodôntica corretiva total.


Link do artigo na integra via ULBRA:

3 comentários:

  1. Boa Tarde Marlos! O link para o artigo não abre. Gostaria muito de ler, pois estou escrevendo minha monografia de especialização sobre o assunto. Seu blog é excelente! Parabéns!

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  2. Olá Andrezza,

    Obrigado pelos elogios. O link do artigo foi corrigido, tente agora, qualquer problema retorne contato!!! Boa sorte com seu trabalho !!!

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  3. Muito obrigada! Deu certo! Abçs!

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