ORTODONTIA CONTEMPORÂNEA: Planejamento ortodôntico e cirurgia de dentes não irrompidos: quando, quantos e quais suas conseqüências

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Planejamento ortodôntico e cirurgia de dentes não irrompidos: quando, quantos e quais suas conseqüências


Neste artigo de 2006, publicado pela Revista Dental Press, pelo Prof. Dr. Alberto Consolaro Professor Titular em Patologia Bucal pela Faculdade de Odontologia de Bauru - FOB-USP - São Paulo. Faz uma bela explanação sobre um assunto tão importante e controverso.

Os dentes não irrompidos, especialmente os terceiros molares e caninos superiores, interferem direta e imediatamente no planejamento ortodôntico, mas nem sempre. Quando se têm espaço no arco dentário e antagonistas para uma relação oclusal harmoniosa os terceiros molares poderão estar incluídos no planejamento ortodôntico. Por que o ortodontista deve se preocupar com os dentes não irrompidos, especialmente os terceiros molares, quando não interferem direta e imediatamente no seu planejamento?

Há muito tempo sabe-se que a presença ou ausência dos terceiros molares inferiores não interfere no grau de apinhamento anterior, mas outras conseqüências muito importantes nos levam a refletir porque indicar ortodonticamente a remoção de dentes não irrompidos.

A possibilidade de um dente não irrompido dar origem a um cisto ou neoplasia odontogênica é muito pequena e estatisticamente representa uma ocorrência eventual e impossível de ser representada percentualmente, de tão pequena, mas o risco existe e deve ser considerado, principalmente se não há contraindicações locais e sistêmicas para procedimentos cirúrgicos. Infelizmente quando se indica a exodontia para prevenir-se de cistos e tumores, na grande maioria das cirurgias dos dentes não irrompidos, deixa-se na loja cirúrgica o folículo pericoronário, o tecido mole que dá origem a estas lesões. Em outras palavras, se não remover o folículo pericoronário e submetê-lo à análise microscópica, nada se preveniu quanto a cistos e tumores e o risco para o paciente continua!

Os terceiros molares não irrompidos, parcial ou totalmente, podem dar origem a incomodativas pericoronarites agudas e crônicas que por fim evoluem para cistos paradentários: praticamente é impossível a higienização adequada de dentes parcialmente irrompidos recobertos pelo capuz pericoronário que forma uma verdadeira “caverna” cujo piso será a face oclusal do molar, constituindo-se um meio ideal para a proliferação bacteriana e estabelecimento de biofilmes microbianos. Soma-se a isso, às vezes, a mordida dos tecidos moles pelos dentes antagonistas, promovendo dolorosas erosões e ulcerações na mucosa sobrejacente.

A persistência dos terceiros molares, com os vetores do crescimento terminal da mandíbula e do processo de remodelação óssea, pode promover a sua aproximação com força ativa sobre os segundos molares e conseqüente reabsorção radicular na face cervical e distal, inclusive com riscos de perda dentária.

A proximidade do terceiro molar com os tecidos periodontais, inclusive gengivais, do segundo molar pode promover penetração profunda e nicho microbiano entre o folículo pericoronário e o esmalte do terceiro molar, mesmo que aparentemente esteja “imerso” ou totalmente “incluso”. Os danos periodontais distais no segundo molar podem ser severos e de difícil solução clínica, o melhor está no prevenir!

Em síntese: a remoção dos terceiros molares deve estar incluída no planejamento ortodôntico principalmente porque representa um seguro preventivo para a estrutura e função plena dos segundos molares.

Na Ortodontia, além dos terceiros molares, os pré-molares e os caninos não irrompidos são comumente indicados para cirurgias, ora exodontias, ora para tracionamentos. Muitos casos são bilaterais, quando não envolvem os quatro quadrantes maxilares. Não raro, especialmente fora do ambiente próprio dos cirurgiões bucomaxilofaciais, há questionamentos como: qual o melhor para o paciente, remover os quatro terceiros molares de uma única vez ou remover primeiro os dois de um dos lados e depois, em um segundo momento cirúrgico, os outros dois?

Entre não cirurgiões bucomaxilofaciais é comum afirmar-se que o melhor seria utilizar-se de dois momentos cirúrgicos, mas a literatura pertinente e a experiência clínica dos cirurgiões bucomaxilofaciais revelam que não. E desde que devidamente explicado aos pacientes, eles também preferem fazer um único procedimento cirúrgico e isto têm sido demonstrado em entrevistas de pacientes que passaram pelos dois tipos de decisão de um ou dois momentos cirúrgicos para se remover os quatro terceiros molares.

Há uma falsa idéia de que facilitaria a alimentação do paciente no pós-operatório se removêssemos os terceiros molares de um dos lados, mas os trabalhos revelam que os pacientes ressaltam que dois momentos cirúrgicos são duas situações ruins se repetindo sem necessidade. Operar a boca, mesmo que de um lado, atrapalha a alimentação inevitavelmente, tal como se realizada a cirurgia nos dois lados.

O tempo cirúrgico, com exposição do meio interno ao meio contaminado da boca, somando-se os dois momentos cirúrgicos e comparando quando se remove todos os quatro de uma vez, é muito menor. Em outras palavras, o risco de infecção é muito menor, bem como de hemorragias e edemas quando se opta por um único momento.

O mais interessante nos dados da literatura se refere ao número de desistência do segundo momento cirúrgico por parte dos pacientes, um número considerável, em torno de 10%. O grau de satisfação do paciente operado dos quatro terceiros molares comparado com os submetidos a dois procedimentos cirúrgicos se apresenta muito mais elevado. Ainda mais se considerarmos que o paciente ficará afastado de suas atividades normais apenas uma vez, reduzindo prejuízos de afastamento do trabalho, perda de oportunidades, restrição de atividades esportivas, lazer e pessoais decorrentes do pós-operatório.

Ao remover os pré-molares não devemos nos preocupar com o tempo em que poderemos em seguida promover a movimentação dos dentes vizinhos em direção ao alvéolo recém desocupado. Este tempo pode ser pequeno, de 15 a 30 dias depois, e em alguns casos até antes. A preocupação maior deve estar relacionada com a tábua óssea alveolar externa e vestibular e com a quantidade de gengiva inserida que permanecerá na área operada. Se a tábua óssea for excessivamente luxada ou fraturada, o que ocorre geralmente em cirurgias mais longas, durante o reparo alveolar se perderá altura óssea indesejada. Ao mesmo tempo no reparo destas áreas com perda da tábua óssea vestibular se compromete também a presença de gengiva inserida na região que poderá ser substituída por mucosa alveolar. Como conseqüência desta situação quando o dente vizinho, pré-molar ou canino, for movimentado para a região do dente extraído poderá ocorrer uma severa recessão gengival de vários milímetros pela falta de espessura da tábua óssea vestibular e ausência de gengiva inserida.

Outro cuidado: procure não ancorar as alavancas cirúrgicas na região cervical dos dentes vizinhos como caninos e pré-molares. Ao longo dos meses e anos poderá ocorrer a Reabsorção Cervical Externa iniciada por lesão da junção amelocementária.

A remoção de terceiros molares pode afetar a altura da crista óssea alveolar do segundo molar. Se for manipulada excessivamente, a redução do nível ósseo distal do segundo molar pode expor a superfície distal externa da raiz, promovendo hipersensibilidade temporária ou permanente. No reparo alveolar, a redução da crista óssea distal pode promover a formação de bolsa gengival ou periodontal em uma região de difícil acesso para a limpeza, dificultada mais ainda pela sensibilidade aumentada, podendo-se inclusive, ao passo de alguns meses e anos, levar à perda do dente.

Para expor o esmalte com a finalidade da colagem de braquete o cirurgião deve remover o folículo pericoronário, um tecido mole membranoso altamente especializado de tecido conjuntivo firmemente aderido ao esmalte por um epitélio reduzido do esmalte. Tanto o epitélio quanto o tecido conjuntivo fibroso do folículo pericoronário se inserem na região cervical, ou mais precisamente na junção amelocementária. Deve-se abrir somente uma janela no folículo para permitir a fixação do braquete, jamais desencapar toda a coroa e remover todo o tecido mole, manipulando-se indevidamente a junção. Esta manobra, se realizada, pode promover a indução posterior da Reabsorção Cervical Externa durante ou logo após o tracionamento. Por muito tempo se acreditou que esta reabsorção era culpa do tracionamento, mas na verdade decorre da manipulação cirúrgica indevida e desnecessária da região cervical do canino.

O ortodontista deve trocar informações e necessidades com seu cirurgião bucomaxilofacial, afinal as cirurgias com finalidades ortodônticas são realizadas em dentes geralmente hígidos e em pacientes conscientes da importância de sua dentição na sua vida; são pessoas minimamente diferenciadas e a situação especial. Estas informações não são repassadas aos cirurgiões nos seus cursos de formação; o ortodontista como parceiro deve dialogar e o cirurgião bucomaxilofacial aceitar as especificidades, afinal se algum problema houver após o procedimento cirúrgico o questionamento do paciente será:

… eu não tinha qualquer problema dentário e agora passei a ter; eu tinha todos os dentes saudáveis, agora estou com problemas; algo aconteceu comigo ou fui vítima de algum procedimento mal planejado ou inconseqüente?


Link do artigo na Integra via Dental Press:

www.dentalpress.com.br/cms/wp-content/uploads/2008/10/controversiav5n2.pdf

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