ORTODONTIA CONTEMPORÂNEA: Freqüência de relatos de parafunções nos subgrupos diagnósticos de DTM de acordo com os critérios diagnósticos para pesquisa em DTMs

terça-feira, 3 de março de 2009

Freqüência de relatos de parafunções nos subgrupos diagnósticos de DTM de acordo com os critérios diagnósticos para pesquisa em DTMs




Neste artigo de 2008, publicado pela Dental Press, pelos autores Raquel Stumpf Branco, Carla Stumpf Branco, Ricardo de Souza Tesch, Abrão Rapoport; da Faculdade de Medicina devPetrópolis - Rio de Janeiro. Mostram neste artigo as formas de manifestações das DTMs, periodicidade e outras particularidades.

As disfunções temporomandibulares (DTM) podem ser definidas como um conjunto de condições
dolorosas e/ou disfuncionais, que envolvem os músculos da mastigação e/ou as articulações temporomandibulares (ATM). Estas condições não possuem etiologia ou justificativa biológica comum e, desta forma, caracterizam um grupo heterogêneo de problemas de saúde. Seus sintomas característicos são: dor à palpação muscular e/ou articular, função mandibular limitada e ruídos articulares, com a prevalência total destes sintomas atingindo mais de 75% da população adulta.

A falta de um perfeito entendimento da relação entre fatores etiológicos e mecanismos fisiopatológicos envolvidos em cada subgrupo de DTM determina que sua classificação atual seja preferivelmente baseada em seus sinais e sintomas do que em sua etiologia. Atualmente, o “Critério Diagnóstico para Pesquisa em Disfunção Temporomandibular” (RDC/TMD) oferece a melhor classificação para DTM, já que inclui não apenas métodos para a classificação diagnóstica física das DTMs, presentes no seu eixo I, mas ao mesmo tempo métodos para avaliar a intensidade e severidade da dor crônica e os níveis de sintomas depressivos, presentes no seu eixo II.

Denomina-se hábitos parafuncionais aqueles não relacionados à execução das funções normais do sistema estomatognático, como a deglutição, mastigação e fonação. Segundo MacFarlane et al., fatores mecânicos locais, como os hábitos parafuncionais, apresentam papel importante na etiologia da dor orofacial, podendo sua influência variar segundo a tolerância do paciente à dor e suas diferentes respostas bioquímicas e fisiológicas a estes fatores. Para Molina et al., dentre os hábitos orais que afetam as estruturas mastigatórias está o hábito de ranger ou apertar os dentes, também denominado de bruxismo.

De acordo com a Academia Americana de Dor Orofacial e a Associação Americana de Desordens do Sono, o bruxismo é caracterizado por atividade parafuncional noturna e/ou diurna involuntária dos músculos mastigatórios, rítmica ou espasmódica, podendo apresentar apertamento e/ou ranger dos dentes. Hereditariedade, fumo e excesso de consumo de café são alguns fatores de risco para o desenvolvimento do bruxismo.

O termo bruxismo do sono é preferencialmente utilizado no lugar de bruxismo noturno, pelo fato das pessoas rangerem ou apertarem os dentes quando dormem, de dia ou à noite. É reconhecido como um problema clínico há décadas, embora sua fisiopatologia permaneça controversa. Carlsson et al. sugeriram que o bruxismo tem regulação central e não periférica. Num episódio de bruxismo, o cérebro é primeiramente ativado, depois é notada uma aceleração cardíaca autonômica e, então, a musculatura mastigatória é fortemente ativada.

Evidências sugerem que os episódios de bruxismo do sono estão intimamente relacionados ao aumento das atividades eletroencefalográfica, eletromiográfica e freqüência cardíaca, que são parte dos micro-despertares freqüentes durante o sono. Cerca de 60% dos indivíduos normais apresentam atividade involuntária rítmica da musculatura mastigatória, que ocorre a uma freqüência de 1,8 episódios por hora de sono, a qual pode estar associada à necessidade de estímulo da produção de saliva durante a noite. Em pacientes com bruxismo do sono esta atividade é 3 vezes mais freqüente, as contrações musculares de maior amplitude e acompanhadas de ruídos dentários.

Como descrito por Kato el al., o Critério Diagnóstico Polissonográfico de Pesquisa para o Bruxismo do Sono investiga a atividade eletromiográfica em músculos mastigatórios (masseter ou temporal) e o tipo de episódio de bruxismo do sono (que pode ser fásico, tônico ou misto). Os registros laboratoriais incluem eletroencefalografia, eletromiografia, eletrocardiograma e sensor térmico, simultâneos com gravações audiovisuais, oferecendo registros altamente controlados para que outras desordens do sono possam ser descartadas e o bruxismo seja discriminado de outras atividades orofaciais que ocorrem durante o sono. Com o estudo polissonográfico, o diagnóstico clínico do bruxismo é corretamente proposto em 83,3% dos bruxômanos. Entretanto, embora mais confiáveis, têm sua utilidade diagnóstica limitada por sua complexidade de realização e alto custo.

O bruxismo pode também ser clinicamente diagnosticado pela presença de desgaste dentário superior ao considerado normal para a idade, havendo, no entanto, necessidade de diferenciálo do desgaste causado por outros fatores, como dieta específica ou outros hábitos orais. Muitas vezes desgastes dentários evidentes clinicamente não têm correlação com o nível do bruxismo no presente momento, podendo representar registro acumulativo de desgastes parafuncionais e funcionais, pois 40% da população saudável e que não range os dentes apresentam desgastes dentários.

As pressões intra-articulares maiores que 40mmHg ultrapassam a pressão dos capilares periféricos e podem causar hipóxia intra-articular temporária, seguida pela re-oxigenação, uma vez que o apertamento é interrompido, com uma resultante liberação de radicais livres. Ao avaliar os níveis de pressão intra-articular presentes nas ATM dos pacientes que estavam acordados e foram submetidos ao procedimento de artrocentese, Nitzan encontrou que o apertamento voluntário dos dentes produziu altos níveis de pressão intraarticular, maiores que 200mmHg. Existe um dano direto aos componentes do tecido celular e extracelular causados por radicais livres, como o aumento na fricção pela diminuição da lubrificação articular adequada, o que poderia, hipoteticamente, levar ao início do processo de deslocamento anterior do disco articular, como descrito em detalhes por Nitzan.

Citosinas pró-inflamatórias foram isoladas de amostras do líquido sinovial colhido da ATM de indivíduos sintomáticos, fato provavelmente relacionado a evidências recentes demonstrando que os radicais livres podem estimular a síntese celular destas proteínas, promovendo um importante efeito pró-inflamatório e de decomposição da estrutura extracelular envolvida no processo de degeneração articular.

Estudos sobre a influência das parafunções na dor orofacial são ainda limitados, porém indicam que o início das DTMs dolorosas possivelmente esteja relacionado ao acúmulo de carga proveniente de hábitos parafuncionais sobre as estruturas do sistema estomatognático. Pesquisas têm sido desenvolvidas no intuito de estabelecer a relaçãoentre parafunções orais, como o bruxismo e o apertamento dentário, e o início ou agravamento de dores orofaciais, mais especificamente da dor muscular mastigatória e artralgia temporomandibular, acompanhada ou não de alterações degenerativas.

No presente estudo, o relato de bruxismo do sono apresentou freqüência de ocorrência inferior (55,5 %) à apresentada pelo relato de apertamento dentário (64,8%). Quando cada diagnóstico do RDC/TMD foi avaliado, associado ou não a outros diagnósticos, a parafunção diurna também foi mais freqüentemente relatada que a do sono. Para Kato et al., o bruxismo avaliado através do autorelato pode ser subestimado. Segundo Chung et al. , cerca de 70% dos pacientes com bruxismo do sono não têm conhecimento deste hábito. Como a parafunção diurna acontece com o indivíduo desperto, torna-se mais fácil sua percepção e, conseqüentemente, seu auto-relato é mais freqüente em relação ao bruxismo do sono.

O presente trabalho demonstrou que o relato associado de ambas as parafunções, diurna e do sono, é mais freqüente em todos os subgrupos diagnósticos do que a presença individual de cada uma. Como previamente demonstrado, pacientes com DTM apresentam níveis elevados de atividade nos músculos masseter e temporal em repouso, da mesma forma que pacientes com cefaléia do tipo tensão.

As parafunções orais avaliadas no presente estudo podem ser identificadas clinicamente e, portanto, o profissional de saúde deve investigar sinais e sintomas possivelmente relacionados a estas patologias que, uma vez identificadas, devem ser tratadas como fatores de risco para o desenvolvimento das diferentes formas de DTM. Para tal, os protocolos terapêuticos devem ser instituídos com o objetivo de controlar a manifestação destas atividades parafuncionais ou, pelo menos, seus efeitos sobre o sistema estomatognático como forma de prevenção do desenvolvimento de DTM.


Link do Artigo na Integra via Scielo:

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